A Receita Federal e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) anunciaram nesta terça-feira, 3, uma nova possibilidade de transação tributária, modalidade de negociação de créditos tributários que estejam em disputa na Justiça ou em órgãos administrativos envolvendo a União e o contribuinte. Desta vez, de acordo com edital publicado hoje, será possível dívidas envolvendo a chamada amortização de ágio, principal discussão tributária na Receita Federal e no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão recursal do Fisco.
O ágio se forma quando uma empresa adquire participação em outra (operações societárias). Nem sempre o valor pago corresponde ao valor patrimonial da companhia comprada. Ágio é o sobrepreço, a diferença entre o valor pago e o patrimonial, em razão de uma expectativa de lucros futuros que a compradora terá com a aquisição da outra empresa. A legislação tributária permite à compradora deduzir esse sobrepreço da renda a ser tributada nos anos seguintes (amortização do ágio).
Ao longo dos anos, a Receita Federal impôs condições para o aproveitamento do ágio pelas empresas compradoras e lavrou autos de infração nos casos em que interpretou terem sido desrespeitadas essas condições. A modalidade divulgada hoje permite negociar as dívidas envolvendo os tributos que não teriam sido pagos nessas amortizações de ágio.
Segundo o procurador-geral da Fazenda Nacional, Ricardo Soriano, há R$ 150 bilhões em discussões envolvendo a tese de amortização e despesa de ágio que, agora, podem ser transacionadas. O valor envolve tanto discussões administrativas quanto judiciais.
Conforme revelado pelo Estadão/Broadcast nos últimos meses, há R$ 1 trilhão em litígios tributários paralisados no Carf – somando discussões em trâmite na Receita Federal, o montante chega a R$ 1,7 trilhão. A situação se agravou com a operação-padrão dos auditores fiscais.
Em relação às teses de ágio, o Ministério da Economia informou que atualmente há 377 processos sobre o tema, sendo 322 no Carf e 66 nas delegacias da Receita Federal.
A norma publicada nesta terça prevê três tipos de desconto:
– pagamento de entrada no valor de 5% do valor total do débito ou da inscrição elegível à transação, sem reduções, dividida em 5 parcelas mensais e sucessivas, sendo o restante parcelado em até 7 meses, com redução de 50% do valor do montante principal, da multa, dos juros e dos demais encargos.
– pagamento de entrada no valor de 5% do valor total do débito ou da inscrição elegível à transação, sem reduções, dividida em 5 parcelas mensais e sucessivas, sendo o restante parcelado em até 31 meses, com redução de 40% do valor do montante principal, da multa, dos juros e dos demais encargos
– pagamento de entrada no valor de 5% do valor total do débito ou da inscrição elegível à transação, sem reduções, dividida em 5 parcelas mensais e sucessivas, sendo o restante parcelado em até 55 meses, com redução de 30% do valor do montante principal, da multa, dos juros e dos demais encargos.
A primeira parcela da entrada deverá ser paga até o último dia útil do mês da adesão, as demais da entrada deverão ser pagas até o último dia útil dos meses subsequentes ao mês de vencimento da parcela anterior. O valor da parcela mínima deverá ser de R$ 100,00 para pessoa física e R$ 500,00 para pessoa jurídica.
A adesão à transação pode ser formalizada desde segunda, 2, até às 19h do dia 29 de julho de 2022.
Na avaliação do advogado tributarista Matheus Bueno, sócio do Bueno Tax Lawyers, com a medida divulgada hoje, as empresas afetadas precisam dimensionar os riscos de se manter os processos contra o Fisco e arriscar uma derrota de 100% da cobrança, ou abrir mão da disputa por uma dívida certa, mas com desconto significativo.
Ele pondera que, depois de anos de embate entre Fisco e empresas, já existe grau de confiança na previsibilidade das chances de sucesso da defesa nos litígios tributários. “Hoje, já não seria algo impossível diferenciar uma briga boa de uma briga perdida. Já temos precedentes julgados no Judiciário, então o desconto oferecido há de ser suficientemente atraente se o caso em questão estiver próximo dos julgados positivos”, explicou.
Representantes da Fazenda Nacional negaram que a publicação do edital tenha relação com a nova regra de desempate no Carf. Hoje, quando um julgamento termina empatado, o contribuinte sempre deve ser favorecido. E, geralmente, discussões envolvendo amortização de ágio, dada sua complexidade, sempre terminam em empates nos colegiados do órgão.
Até hoje, só era possível realizar transações tributárias envolvendo processos já inscritos em dívida ativa pela União e, em relação a teses, sobre discussões envolvendo programas de Participação nos Lucros e Resultados (PLRs).
Sobre as negociações envolvendo processos em dívida ativa, mais de R$ 260 bilhões em dívidas com contribuintes foram regularizadas, em mais de 1 milhão de acordos em dois anos, segundo o procurador-geral Ricardo Soriano.
Fonte: Estadão