A Advocacia-Geral da União (AGU) defendeu, em manifestação enviada ontem ao Supremo Tribunal Federal (STF), a constitucionalidade do aumento do valor do fundo eleitoral de 2022, que vai financiar, com dinheiro público, as próximas campanhas políticas. O órgão também pediu à Corte que rejeite a ação em que o partido Novo pede a revogação da aprovação do fundo. Na argumentação, a AGU nega que tenha sido feito um “novo cálculo” fora dos parâmetros legais.
Em dezembro, o Congresso Nacional aprovou o relatório final do Orçamento de 2022, com previsão de R$ 4,9 bilhões para o fundo eleitoral. Mas o valor final pode ficar ainda maior, caso avancem as negociações do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, junto ao Ministério da Economia, para que as campanhas eleitorais deste ano contem com R$ 5,7 bilhões. A equipe econômica busca uma forma de remanejar R$ 800 milhões para turbinar o fundo dentro da revisão da Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Segundo a manifestação da AGU, “não se apresenta razoável partir da premissa de que a destinação de recursos para campanhas eleitorais, definida por critérios legais, estaria a depender de um sarrafo quantitativo para sabermos se atende ou não ao princípio constitucional da moralidade”. O órgão afirma que os critérios para a distribuição dos recursos do fundo estão “delineados em lei”.
“O que se fez foi estabelecer a diretriz para o projeto de lei orçamentária de 2022, no caso, como se discriminam as dotações destinadas ao Fundo, em convergência com o piso e com os critérios estabelecidos na Lei nº 9.504/1997. Não se criou nova fórmula de cálculo para o aumento discricionário do Fundo”, acrescenta a AGU.
Conforme o órgão, “a forma de distribuição dos recursos, por sua vez, guarda uma métrica objetiva e legalmente prevista, de modo que adotar a premissa de que, quanto maior for o valor destinado para as campanhas, maior será o desvio de finalidade, seria, por si só, um equívoco, sobretudo, por estarmos diante da ausência de elementos concretos para tanto”.
Argumentação
Na ação no Supremo, o Novo argumenta que o dispositivo criado no Congresso para aumentar a verba do fundo eleitoral, prevista inicialmente em R$ 2,1 bilhões, seria inconstitucional por invadir a competência do presidente da República — a quem cabe enviar a proposta orçamentária, incluindo os critérios para se definir o valor do fundo.
O ministro André Mendonça, recém-empossado no STF, é o relator da ação movida pelo Novo. Na semana passada, o magistrado, que já foi advogado-geral da União do atual governo, pediu informações à Presidência e ao Congresso e levará o assunto à apreciação do plenário da Corte.
O Executivo passou a negociar o aumento das verbas do fundo eleitoral após pressões de caciques do Centrão, grupo de partidos que apoiam o governo e o projeto do presidente Jair Bolsonaro (PL) de se reeleger.
Ao mesmo tempo, lideranças do bloco articulam para que seus interesses eleitorais não sejam atingidos pelo corte de R$ 9 bilhões que o Ministério da Economia precisa fazer no Orçamento 2022 para ajustar as contas. Segundo a equipe do ministro Paulo Guedes, o corte é necessário para cobrir despesas que foram subestimadas pelo Congresso durante a tramitação do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias deste ano. Bolsonaro tem até a sexta-feira para sancionar o Orçamento, com ou sem cortes.
De acordo com apuração do Correio junto a integrantes do Centrão, que falaram na condição de anonimato, o principal interesse do grupo é poupar dos cortes os recursos de emendas parlamentares, com as quais deputados e senadores enviam benefícios para seus redutos eleitorais. As chamadas emendas do relator, por exemplo, que não têm transparência e servem para o governo barganhar apoio no Congresso, contam com uma previsão de R$ 16,5 bilhões para este ano.
Proteção
Na avaliação do economista Ciro de Avelar, a discussão sobre os cortes no Orçamento tem se desenrolado de maneira a garantir que Ciro Nogueira, um dos caciques do Centrão, comande as rédeas dos ajustes de forma a não causar prejuízos ao grupo político. “Isso ficou claro com as emendas do relator, que não serão cortadas e já estão destinadas, de, aproximadamente, R$ 16 bilhões”, disse. “O corte de R$ 9 bilhões tende a não prejudicar parceiros e aliados que serão muito importantes este ano para a base eleitoral do presidente”, frisou.
Avelar destacou que Nogueira está mapeando quais são os parlamentares fiéis ao governo nas votações do Congresso. “Esse corte deve vir, principalmente, nas emendas que não são de interesse do governo ou que não devem refletir numa perspectiva positiva a Bolsonaro”, avaliou.
Renato Ribeiro de Almeida, advogado especialista em direito eleitoral, teme que por trás dessas discussões haja “apenas uma manobra eleitoreira, favorecendo emendas parlamentares, em detrimento da necessidade de apertar os gastos orçamentários do ano”.
Crítica ao aumento do fundão
O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) criticou a tentativa do Centrão de ampliar o já turbinado Fundo Eleitoral, de R$ 4,9 bilhões para R$ 5,7 bilhões. “Eu vejo como inviável. Acho que no Senado não passa. Não tem sentido aumentar”, afirmou, em entrevista ao programa CB.Poder, parceria entre o Correio e a TV Brasília. A iniciativa de aumentar o chamado fundão é liderada pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, um dos caciques do Centrão. O movimento começou depois que o presidente Jair Bolsonaro entregou o controle do Orçamento ao político do PP. Izalci destacou, porém, que não basta a vontade de Nogueira de aumentar o fundão. “A suplementação desse valor passa pelo Congresso. Teria de ser por um PLN (Projeto de Lei do Congresso Nacional), teria de passar pela CMO (Comissão Mista de Orçamento) e, depois, ir à votação.”