Após mais de dois meses de intensas discussões, a Câmara dos Deputados introduziu as primeiras alterações no extenso projeto de lei complementar que regulamenta a reforma tributária sobre consumo. Com cerca de 600 páginas, o projeto não incluiu carnes na lista de produtos da cesta básica que serão isentos do futuro Imposto sobre Valor Adicionado (IVA).
Os parlamentares decidiram incluir carros elétricos e apostas no Imposto Seletivo, também conhecido como imposto do pecado. Além disso, a nova versão do texto legislativo cria a figura jurídica do nanoempreendedor e faz pequenas modificações na lista de medicamentos que terão alíquotas zero ou reduzidas.
As alterações feitas ainda podem ser modificadas durante a tramitação no plenário. O presidente da Câmara, Arthur Lira, afirmou que pretende colocar o texto em votação na próxima semana.
Ao contrário da PEC da reforma tributária, que necessitava de três quintos dos votos para aprovação, o projeto de lei complementar requer apenas maioria absoluta: 257 votos na Câmara e 41 no Senado. A votação acontece em turno único, mas o texto pode retornar à Câmara caso seja alterado no Senado.
As mudanças foram propostas por um grupo de trabalho formado por deputados de vários partidos: Claudio Cajado (PP-BA), Reginaldo Lopes (PT-MG), Hildo Rocha (MDB-MA), Joaquim Passarinho (PL-PA), Augusto Coutinho (Republicanos-PE), Moses Rodrigues (União-CE) e Luiz Gastão (PSD-CE). Arthur Lira formou esse grupo para alcançar um consenso, dado o caráter complexo do projeto.
A aprovação e sanção do projeto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva não implicam em mudanças imediatas nas regras tributárias. Está previsto um período de transição de 2026 a 2033, durante o qual os tributos atuais sobre consumo serão gradualmente substituídos pelo IVA e pelo Imposto Seletivo.
Principais alterações no projeto
Carnes e cesta básica
Embora o presidente Lula tenha defendido a inclusão de carnes “populares” na cesta básica, o grupo de trabalho manteve esses itens fora da lista. As carnes bovinas e de frango continuarão pagando 40% da alíquota cheia do IVA, conforme a proposta original do governo.
Por exemplo, se a alíquota cheia for 26,5%, as carnes pagarão 10,5% de imposto, similar a outros alimentos e insumos agropecuários com alíquotas reduzidas. O grupo justificou que incluir carnes na cesta básica poderia elevar a alíquota do IVA para 27,1%, tornando-a a mais alta do mundo, superando a da Hungria.
Em compensação, sugeriram que carnes bovinas e de frango sejam incluídas no sistema de cashback, que devolverá impostos em dinheiro para famílias de baixa renda. A regulamentação desse sistema beneficiará famílias com renda per capita de até meio salário mínimo e inscritas no CadÚnico. Uma lei ordinária determinará os detalhes do funcionamento do programa.
Imposto Seletivo
O grupo de trabalho ampliou a lista de produtos sujeitos ao Imposto Seletivo, incluindo carros elétricos e apostas. Em contrapartida, caminhões, armas e munições foram excluídos da tributação.
O Imposto Seletivo agora inclui:
– Cigarros
– Bebidas alcoólicas
– Bebidas açucaradas
– Embarcações e aeronaves
– Extração de minério de ferro, petróleo e gás natural
– Apostas físicas e online
– Carros, incluindo elétricos
Nanoempreendedor
Foi criada a categoria de nanoempreendedor, destinada a empreendedores com faturamento anual de R$ 40,5 mil (R$ 3.375 mensais). Eles poderão optar entre o Simples Nacional ou o IVA. Aqueles que optarem pelo IVA não precisarão contribuir para a Previdência Social. Essa nova categoria é destinada a quem fatura metade do limite dos microempreendedores individuais (MEI), que atualmente é de R$ 81 mil anuais.
Medicamentos e absorventes
Os deputados retiraram o citrato de sildenafila (Viagra) da lista de medicamentos com alíquota zero, aplicando 40% da alíquota cheia. A tadalafila continuará com IVA reduzido. Absorventes, que estavam na alíquota reduzida, agora terão alíquota zero.
A quantidade de medicamentos e produtos de saúde com isenção ou alíquota reduzida foi mantida, com 383 substâncias isentas e 850 com alíquotas reduzidas.