A seccional da OAB no Piauí tem uma gama de tarefas a serem cumpridas no triênio. A gestão atual, dirigida por Celso Barros Coelho Neto, se propôs a, dentre outras metas, fortalecer a defesa das prerrogativas, fiscalizar o acesso ao Judiciário pelos advogados do estado, restabelecer as contas da entidade no pós-pandemia, implementar a advocacia dativa na região.
O problema do acesso ao Judiciário no Piauí, segundo o presidente, notadamente o estadual, se dá pelo número insuficiente de juízes.
“A falta de acesso à Justiça é pela própria falta de estrutura do Judiciário, que não consegue chegar em todo o estado. E nós tivemos aqui a agregação de comarcas. E essas agregações de comarcas acabaram prejudicando o cidadão piauiense, que deixou de ter o Judiciário próximo, na sua própria cidade”, conta.
Ele defende que muitas comarcas devem voltar a existir, e a OAB-PI luta por isso.
Também tendo em vista esse alargamento do acesso às estruturas do Estado de Direito, Celso Barros Coelho Neto afirma que mira 2023 como o ano em que a advocacia dativa será concretizada no estado.
De acordo com ele, não há um plano para que, nos próximos anos, haja a reestruturação da Defensoria Pública. Portanto, surge a necessidade de que advogados privados sejam designados para dar conta do atendimento à população hipossuficiente.
Celso Barros Coelho Neto conta com a experiência de anos de militância no sistema OAB e a inspiração familiar para o cumprimento das missões propostas.
O avô dele, Celso Barros Coelho, que comemorou 100 anos de idade em 11 de maio, presidiu a instituição de 1963 a 1974. Para o neto e atual presidente, a participação na OAB ajuda na construção da entidade, melhoria dos serviços e no engrandecimento da importância social da Ordem.
Confira aqui a íntegra da entrevista.
CFOAB – Qual será o foco de sua gestão?
Celso Barros Coelho Neto – O nosso foco prioritário é a defesa das prerrogativas e a fiscalização quanto ao funcionamento do Judiciário. Com relação a prerrogativas, toda e qualquer ofensa a prerrogativas que chega ao conhecimento da OAB, nós, de forma enérgica, agimos e agiremos fazendo com que os direitos das prerrogativas sejam respeitados, de norte a sul do Piauí. Nós temos a Comissão, temos a Procuradoria das Prerrogativas e temos a equipe destacada da OAB para que haja a fiscalização concreta quanto ao respeito às prerrogativas da advocacia piauiense. E, com relação ao Judiciário, nós estamos também monitorando, dialogando com o Judiciário trabalhista, o federal e o estadual. Nessas três áreas, há pedido para que haja efetivamente a prestação jurisdicional no pós-pandemia. Agora, com esse pós-pandemia, o Judiciário deve voltar a prestar a jurisdição. Porque quem ganha é a sociedade. Claro, por intermédio da advocacia.
CFOAB – Qual é a importância da OAB para a advocacia?
Celso Barros Coelho Neto – A OAB é vital para a advocacia. Ela é uma instituição que agrega, congrega todos os nossos interesses enquanto advogados. É claro que nenhuma instituição é perfeita. Mas a instituição vai ficar muito mais próxima da perfeição na medida em que todos nós nos aproximarmos dela. Então, a OAB é vital, porque ela trata todos nós de modo corporativo — eu chamo sempre de corporativismo do bem —, mas substancialmente porque ela sempre vai refletindo o que a sociedade precisa da advocacia. Quando a sociedade traz determinadas demandas a nós, advogados, já sabemos que a sociedade precisa do nosso apoio. E essa essa harmonia entre a OAB, a sociedade e a advocacia é muito importante. É uma fórmula muito importante da harmonia entre os atores. A OAB vai ao seu centenário e foi forjada ao longo dos anos, com o passar das décadas, por pessoas que se dedicaram à nossa profissão. E por isso mesmo que ela é, hoje, importante. De forma objetiva, a importância da OAB para a advocacia é que, primeiro, ela blinda a nossa profissão, e, no segundo aspecto, é a importância social que ela tem e ter essa importância social reflete positivamente na advocacia, no dia a dia do advogado.
CFOAB – Qual é a importância da OAB na sua vida?
Celso Barros Coelho Neto – No sistema OAB, eu fui membro da Comissão de Direitos Humanos; depois, no ano 2000, elegi-me conselheiro seccional; em 2003, secretário-geral; em 2015, conselheiro federal; em 2018, a presidente e, agora em 2021, reeleito na Presidência. E eu sempre tive interesse de me aproximar da instituição, não só por questões de história. Meu avô foi presidente da OAB por seis vezes aqui no Piauí. Foi o que mais tempo passou à frente da Ordem. Foi presidente por seis vezes e inclusive está vivo e fez 100 anos de idade neste mês de maio. Mas, muito além disso, claro, o interesse de estar próximo à instituição da qual eu sou filiado. Eu creio que os advogados têm que ter essa intenção de se aproximar, se candidatar, participar de uma comissão, de discussões. E a questão política vem naturalmente. Com o passar dos anos, na medida em que a gente se envolve, isso foi me despertando o interesse. Eu era ainda muito jovem, quando fui eleito conselheiro seccional. Tinha cinco anos de inscrição. E é uma experiência enriquecedora, porque a gente se aproxima e conhece a fundo a instrução da qual a gente faz parte. Isso sempre me despertou. Claro, por meu avô ter sido presidente em determinada época. Mas isso não seria o suficiente. O importante é que o advogado, independentemente de ter vínculos afetivos ou familiares, é que ele desperte o interesse e se aproximar, vivenciando as comissões, participando de eventos, congressos, cursos, se aproximando da Caixa de Assistência, uma série de convênios, porque ele vai sentir realmente essa valorização e ver a importância efetiva na instituição. Então são dois fatos que realmente fizeram me aproximar: a questão afetiva, mas também a questão da importância que a instituição tem. E isso fez com que a gente tivesse essa trajetória de sempre estar próximo da OAB. Tem crescido muito a dimensão da OAB, notadamente na questão social, na assistência da advocacia. E a OAB tem de ficar preparada para esses desafios, para sempre trazer mais importância. O futuro está sempre trazendo mais desafios e a nossa instituição tem que estar preparada para isso.
CFOAB – Pode contar um pouco da sua história com a advocacia, de onde surgiu o interesse?
Celso Barros Coelho Neto – O interesse pelo Direito foi primeiramente pela questão da realidade. Quando a gente observa muito a nossa realidade, necessariamente surgem determinadas inquietudes, por quês, dúvidas, críticas enquanto cidadão. E eu vi que o curso de Direito é aquele que propicia as mais diferentes respostas para o dia a dia da nossa sociedade, da nossa realidade. E isso me fez despertar para cursar direito. Mas claro que o fato de ter pai advogado, mãe advogada, um avô advogado de certa forma me influenciou positivamente. Mas o substancial mesmo é que o exercício do bacharelado e a vida estudantil e acadêmica propiciam para o aluno o acesso a informações e situações que nenhum outro curso propicia. Então o cidadão se torna ainda mais pleno na medida em que tem acesso a essa estrutura acadêmica que tem um curso de direito. Isso realmente me fez despertar às necessidades de conhecer mais profundamente a nossa realidade, a sociedade, a cidadania, a democracia. Esses valores influenciam a gente a se aproximar do curso de Direito. E isso aliado à questão familiar. Eu cheguei a pensar seriamente em cursar educação física, pela questão dos vínculos com o esporte. Mas pesou a questão da aproximação com os reais valores da sociedade e também a questão familiar.
CFOAB – O senhor acumula outro desafio com a coordenação nacional do Exame de Ordem. Como o senhor entende que deve ser essa tarefa?
Celso Barros Coelho Neto – Essa coordenação traz, de certa forma, uma responsabilidade, uma organização global da porta de entrada da OAB, que é o Exame de Ordem. Então o Exame de Ordem tem a sua grande importância. E deve manter a sua indispensabilidade enquanto realmente um divisor de águas para o acesso do bacharel para a advocacia. E deve ser uma prova que realmente exija conhecimentos. Não pode ser uma mera prova burocrática. Ela deve realmente exigir conhecimentos, buscar explorar efetivamente a capacidade daqueles que querem advogar. Não pode ser uma mera avaliação. Tem que ser um exame, como o nome já diz, uma prova de que aquele que seja aprovado se sinta realmente capaz de advogar. Então esse hoje eu acho que é o desafio que nós temos enquanto representantes do Piauí no sistema OAB, de modo geral.
CFOAB – Tem medidas, projetos ou programas da seccional que considera interessantes destacar? Poderia contar um pouco sobre?
Celso Barros Coelho Neto – Nós temos um desafio interessante de iniciar, introduzir a advocacia dativa no Piauí. É um estado muito extenso, tem a Defensoria Pública, mas que não consegue estar presente em todo o Piauí. E, por conta da Defensoria Pública com o número aquém do necessário, e esse número não irá aumentar nos próximos anos, não há um plano para que nesses próximos anos haja, realmente, a reestruturação da Defensoria aqui, surge a necessidade de que nós implementemos a advocacia dativa. Nós temos um projeto de iniciar a implementação da advocacia dativa em todo o estado, a fim de que o Judiciário possa realmente pagar por aqueles advogados que estão advogando pelas pessoas carentes, pelos mais necessitados. Porque tem muitos locais que não têm efetivamente a Defensoria Pública. E aí esse projeto que nós temos e que é pioneiro a nível de estado está já sendo discutindo amplamente. E nós temos a esperança de que até 2023 seja implementada no estado a advocacia dativa.
CFOAB – Como é gerir a OAB num momento de pandemia?
Celso Barros Coelho Neto – A OAB-Piauí, com o sistema de modo geral, passa por uma certa crise em face da inadimplência que tem números altos. Nós estamos fazendo uma recuperação financeira e o pós-pandemia deixou esses problemas, problemas econômicos que a classe está sofrendo. Nós estamos fazendo um planejamento a fim de que todos os nossos membros tenham condições de voltar a estar próximo da OAB e usufruir dos serviços. É um desafio no pós-pandemia, porque a pandemia deixou sequelas. Sequelas que nós sabemos por conta das mortes, mas também econômicas. E o sistema OAB sente muito isso.
CFOAB – O senhor falou sobre o acesso ao judiciário. Vocês estão tendo dificuldades de serem recebidos pelos magistrados? O que está acontecendo exatamente no Piauí?
Celso Barros Coelho Neto – O acesso ao Judiciário no Piauí, notadamente o estadual, é dificultado por conta da pequena quantidade de juízes. A falta de acesso à Justiça é pela própria falta de estrutura do Judiciário, que não consegue chegar em todo o estado. E nós tivemos aqui a agregação de comarcas. E essas agregações de comarcas acabaram prejudicando o cidadão piauiense, que deixou de ter o Judiciário próximo, na sua própria cidade. Elas estão realmente fazendo com que haja um distanciamento muito grande de regiões do Piauí com o Judiciário estadual. E é um desafio para nós da OAB, mas mantemos a nossa posição de que deve haver a reavaliação das agregações de comarcas, porque dezenas de comarcas foram agregadas, foram incorporadas umas às outras e isso ocasionou o distanciamento dos locais para a sede do fórum, a sede do Judiciário. Isso aconteceu antes da pandemia. Foi na gestão anterior à nossa, em 2017. Mas, de lá para cá, piorou o acesso do cidadão ao Judiciário. Ao invés de melhorar, fez foi piorar o acesso do cidadão ao Judiciário. Não houve efetivamente a melhora da prestação. Houve um distanciamento. E nós estamos com esse projeto de fazer com que haja a revisão das agregações de comarcas. Há uma resistência do Judiciário ainda, de não admitir que efetivamente a agregação de comarcas não atendeu à sua destinação. Há muitas comarcas que devem voltar a existir e a OAB luta por isso.
CFOAB – Por fim, como o senhor entende que deve ser a atuação da OAB perante a sociedade?
Celso Barros Coelho Neto – É sempre um papel de equilíbrio, de estar equidistante do cenário político-partidário, mas, ao mesmo tempo, ter convicções e independência. E essa independência é demonstrada através de todo o sistema OAB, dos diretores a nível nacional, dos diretores das seccionais, dos conselhos federais e estaduais, das subseções, das suas diretorias. Ou seja, é um sistema projetado para que haja efetivamente a independência da OAB. E nós temos que fazer jus aos mandatos que nos foram confiados e sempre agirmos de modo independente enquanto dirigentes da Ordem. Então, sempre quando existe a questão político-partidária, nós devemos sempre estar equidistantes, mas sempre presentes ao mesmo tempo, fomentando o debate, a busca por melhores políticas públicas, o combate à corrupção, à impunidade. Essas são políticas que são institucionais e que devem estar presentes no dia a dia da Ordem.