Na tentativa de conter a escalada de preços dos combustíveis, a Câmara aprovou o substitutivo do Senado para o Projeto de Lei Complementar (PLP) 11/2020, que altera a forma de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) — arrecadado pelos estados — sobre esses produtos, além de zerar, até o fim do ano, as alíquotas de PIS e Cofins, tributos federais, incidentes no diesel e gás de cozinha. Em votação ontem à noite, a proposta foi avalizada por 414 votos contra dois. Até o fechamento desta edição, faltava avaliar destaques. Horas antes, o PLP havia recebido a chancela, também, dos senadores, por 68 votos a um. Agora, o texto vai à sanção presidencial.
Embora nas duas Casas o placar favorável tenha sido com ampla margem, parlamentares da oposição, mesmo votando pela aprovação, afirmaram que o projeto não resolve a questão dos combustíveis, pois o problema estaria no Preço de Paridade de Importação (PPI), adotado pela Petrobras, que vincular o preço do petróleo ao mercado internacional e usar como referência o valor do barril tipo brent, calculado em dólar. “Esse é um projeto que vai baixar centavos. O que vai resolver o preço é o PPI”, frisou a deputada Sâmia Bomfim (PSol-SP).
A Câmara ainda tem de analisar o PL 1.472/2021, que cria a conta de estabilização dos preços dos combustíveis. O texto foi aprovado, também ontem, pelo Senado. Recebeu 61 votos favoráveis e oito contrários. Os dois projetos avançaram no mesmo dia em que a Petrobras anunciou novo reajuste dos combustíveis: 18,7% para a gasolina e 24,9%, para o diesel (leia mais nas páginas 6 e 7). Por isso, o governo pressionou o Parlamento pela aprovação das propostas.
O PLP 11/2020 teve a votação adiada no Senado por três vezes devido à falta de consenso. O texto final prevê a criação de ICMS único sobre os combustíveis para todos os estados e que o tributo seja cobrado na refinaria e não mais sobre o valor final dos produtos (leia quadro). As alterações provocam perda de arrecadação para os estados, o que tem provocado críticas de governadores.
No PL que cria a conta de estabilização dos preços dos combustíveis, os senadores aprovaram a inclusão de um auxílio de até R$ 300 mensais para motoristas autônomos de baixa renda e R$ 100 para motoristas de ciclomotor ou motos de até 125 cilindradas, com prioridade para os beneficiários do programa Auxílio Brasil. Porém, a previsão é de que a medida só entre em vigor em 2023, após o fim do ano eleitoral, para não desrespeitar a legislação.
Insensível
Os parlamentares foram pegos de surpresa com os reajustes anunciados pela Petrobras. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), criticou a estatal. “Causou-me espanto a insensibilidade da Petrobras com os brasileiros, os verdadeiros donos da companhia. O aumento de hoje (ontem) foi um tapa na cara de um país que luta para voltar a crescer”, escreveu nas redes sociais.
O senador Marcelo Castro (PI), vice-líder do MDB na Casa, fez coro a críticas de deputados. Na avaliação dele, os projetos seguram a situação por um curto prazo, mas não resolvem o problema. “Nós estamos atacando a superfície, o acessório. O principal é o PPI. A Petrobras é uma empresa brasileira, ela compra e paga em real. Qual é a necessidade que nós temos de atrelar o preço do petróleo brasileiro?”, questionou. “O Brasil está em crise, as firmas estão falindo, nós estamos saindo de uma pandemia, pessoas perdem empregos, e a Petrobras está nadando em dinheiro. Qual empresa, numa crise que o país está passando, teve R$ 100 bilhões de lucro no ano? O Brasil parece que é o país do banco e da Petrobras.”
Para André Perfeito, economista-chefe da Necton Investimentos, a redução de PIS e Cofins terá efeito reduzido na alta dos combustíveis. “A renúncia fiscal, avaliada em R$ 17,8 bilhões, pode trazer alívio momentâneo, mas, como a tendência é de alta dos combustíveis, uma vez que o petróleo segue sob pressão, deve ter efeito discreto. A questão central é a construção de uma estratégia mais perene, e não apagar incêndios toda vez que temos um choque. É necessário uma estratégia de longo prazo”, defendeu.
O que definem os projetos
PLP 11/2020 — ICMS
O projeto força os estados a cobrarem o ICMS sobre o litro de combustível, e não mais sobre o preço final do produto. Além disso, institui um modelo de cobrança monofásica, em apenas uma fase de comercialização, e de alíquota única entre
os estados.
Como regra de transição, a proposta congela a cobrança de ICMS sobre o diesel, até o fim deste ano, conforme a média de preços dos últimos cinco anos. É uma forma de amenizar o impacto ao consumidor final, principalmente os caminhoneiros.
No mesmo projeto, é prevista a isenção de PIS e Cofins, impostos federais, sobre o diesel e o gás de cozinha até o fim deste ano. A medida vai provocar uma queda de arrecadação de R$ 18 bilhões e não precisará de compensação fiscal, de acordo com o texto, dispensando uma regra da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
PL 1.472/2021 — conta de estabilização
O projeto cria uma conta de estabilização dos preços dos combustíveis no país, autorizando o governo federal a aportar recursos para minimizar o impacto de altas sucessivas na bomba. Os recursos para abastecer a conta incluem os dividendos da Petrobras pagos à União, especificamente a parcela arrecadada acima do previsto no Orçamento, e as receitas do pré-sal, além de outras fontes relacionadas ao petróleo.
No mesmo projeto, foi aprovada a criação de um auxílio-gasolina a motoristas de baixa renda. O custo é de R$ 3 bilhões e beneficiaria motoristas autônomos, taxistas e motociclistas de aplicativo com renda familiar mensal de até três salários mínimos. O benefício, porém, esbarra na lei eleitoral, que proíbe a criação de novos subsídios em ano de eleições.
Foi acrescentado um dispositivo que força a Petrobras a usar os lucros arrecadados em 2022 na amenização dos preços administrados pela própria estatal. O trecho, contudo, não faz referência a anos futuros.
Também teve aprovação na proposta a ampliação do vale-gás pago a famílias carentes, estendendo o benefício a 11 milhões de famílias, o dobro do público atendido atualmente. O impacto é de R$ 1,9 bilhão, também submetido ao teto de gastos.