Em uma verdadeira batalha para convencer o presidente Jair Bolsonaro (PL) de que não é o momento para o reajuste de servidores públicos federais, o ministro da Economia, Paulo Guedes, apresentou uma nova proposta para usar o montante de R$ 1,7 bilhão separado no Orçamento e atender de alguma forma o funcionalismo.
A proposta que está atualmente nas mãos do presidente prevê a concessão de um benefício de R$ 400, a ser incorporado no vale-alimentação, ou seja, sem estar sujeito a tributação (livre de Imposto de Renda).
De acordo com a equipe econômica, o ajuste do auxílio alimentação só contempla o Executivo Civil ativo, em torno de 480 mil pessoas, o que faria com que o aumento dado coubesse dentro do atual orçamento disponível de R$ 1,7 bilhão.
Segundo um técnico do time de Guedes, um reajuste salarial linear teria um impacto maior, contemplando também os aposentados, com um custo estimado de R$ 8,5 bilhões.
A medida é considerada de baixo impacto para a chamada “elite do funcionalismo”, mas, segundo técnicos da pasta, representa um aumento de cerca de 10% para uma boa parte dos servidores, que ganha por volta de R$ 4 mil.
O argumento é de que o presidente estará atendendo de forma linear todos os servidores dentro da possibilidade orçamentária, sem cometer injustiças e ajudando a base da pirâmide do funcionalismo.
Alerta até do Judiciário
Guedes voltou a argumentar que um reajuste exclusivo para os policiais tem potencial de gerar um efeito cascata muito negativo para as contas públicas. Segundo interlocutores do ministro, além de Receita Federal e do Banco Central, cresceu a pressão também por parte do Judiciário.
Segundo apurou a coluna, Guedes recebeu uma ligação de um ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) afirmando que também não via com bons olhos apenas um aumento para as forças de segurança. E que haveria reação do Judiciário.
Na terça-feira passada, representantes da Fenajufe (Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União) já estiveram reunidos com o presidente do STF, Luiz Fux, para tratar de reajustes. No encontro, a categoria dos trabalhadores do Judiciário —que não inclui juízes— deixou claro que não aceita aumentos apenas para os servidores do Executivo.
Guedes teria repassado o alerta ao presidente e disse a interlocutores acreditar que Bolsonaro tomará uma “decisão sensata”.
Bolsonaro fez a promessa pública de conceder aumento aos policiais, categoria que é uma importante base eleitoral, e mesmo com apelos de da equipe econômica continua repetindo acenos neste sentido. O ministro da Justiça, Anderson Torres, se empenhou pessoalmente para conseguir recursos do ministro da Economia.
Guedes, porém, defende que uma reestruturação e valorização das carreiras policiais deveriam estar no escopo da reforma administrativa, que segue empacada no Congresso.
Segundo relatou um interlocutor à coluna, Guedes ‘emparedou’ Torres, argumentando de que se eles forem mesmo apoiadores do presidente “o momento é de compreensão e não de pressão”.
Mas a decisão está tomada?
A equipe de Guedes vem acumulando reveses ao longo da gestão de Bolsonaro, no entanto, o ministro afirma que ainda possui prestígio e a confiança do presidente.
Justamente por isso, na equipe de Guedes a aposta é que Bolsonaro vai optar por uma solução sem “loucuras eleitoreiras”.
Segundo fontes do Planalto, porém, Bolsonaro deve esperar até o último dia permitido pela lei eleitoral, ou seja, 2 de abril, para tomar uma decisão sobre a concessão do benefício ou do aumento apenas para policiais. De acordo com um auxiliar do presidente, há receio de Bolsonaro ser acusado de traição por parte dos policiais, o que faz com que essa possibilidade não seja totalmente sepultada.
Ameaça de greve
O aumento de R$ 400 do vale-alimentação para todos os servidores públicos federais é também uma tentativa da equipe de Guedes para segurar o movimento grevista em Brasília.
Desde o fim de dezembro, categorias do funcionalismo vêm pressionando o governo por aumentos, após o presidente acenar com a possibilidade de elevar salários de policiais federais.
O resultado foram paralisações, entregas de cargos comissionados, operações padrão e ameaças de greve. Na próxima quinta-feira (24), já está marcada mais uma paralisação de servidores do Banco Central.
Puxando o movimento por reajustes estão categorias que aparecem entre as mais bem remuneradas do funcionalismo, como delegados da Polícia Federal, auditores fiscais da Receita e analistas do Banco Central.
Estas categorias, que chegam a ter remuneração superior a R$ 30 mil por mês, alegam que não recebem aumento desde 2017 —parte delas, desde 2019, no primeiro ano de Bolsonaro. Entre outras coisas, os servidores defendem a recomposição inflacionária.
No Ministério da Economia, porém, a visão é de que os servidores públicos, apesar de não terem recebido reajustes nos últimos anos, ainda possuem um saldo positivo se forem considerados mais anos.
O próprio Guedes tem compartilhado um gráfico, formulado pelo professor Bruno Carazza, da Fundação Dom Cabral, de Belo Horizonte, mostrando que de 1998 a 2021 algumas categorias de servidores receberam aumentos superiores à inflação. Os delegados da Polícia Federal, por exemplo, tiveram aumento de 498,9% no período, conforme o levantamento de Carazza. A inflação foi de 326,65%.
O pagamento de R$ 400 a mais de vale-alimentação, seria feito de maneira linear: ou seja, todos os servidores receberiam o aumento, incluindo aqueles com menores salários e menos capacidade de mobilização.
Atualmente, todos os servidores públicos federais recebem vale-alimentação de R$ 458 por mês. Com o aumento sinalizado pelo governo, o valor quase dobraria.
Fonte: Uol Notícias